1 Consulta Publica ABNT5419:2025
Em um cenário de intensificação dos fenômenos atmosféricos e da crescente digitalização de infraestruturas, a revisão da NBR 5419 torna-se não apenas um ajuste normativo, mas um imperativo para a segurança e a resiliência tecnológica nacional.
A nova proposta de revisão da NBR 5419, publicada em consulta pública pela ABNT, representa um salto técnico relevante na engenharia de proteção contra descargas atmosféricas no Brasil. A REVISÃO visa alinhar parcialmente a norma nacional com as diretrizes internacionais da IEC 62305 (2024), introduzindo ajustes técnicos, metodológicos e operacionais. No entanto, a edição 2024 da IEC (3ª edição) introduz mudanças profundas, obrigando uma reavaliação técnica completa para não perpetuar defasagens.
Este artigo apresenta uma análise objetiva, crítica e comparativa das mudanças das Partes 1 a 4 da norma, com destaque para ensaios, inspeções, manutenção, cálculo de risco, materiais e documentação.
O objetivo é apoiar engenheiros e projetistas a emitirem pareceres técnicos conscientes durante o período de consulta pública.
Para você fazer suas observações ou aprovar a nova versão da norma https://www.abntonline.com.br/consultanacional/msg.aspx
2 Parte 1 – Princípios Gerais (NBR 5419-1)
2.1 Ensaio por Componentes (Tabela D.1)
Ensaio por Componentes A IEC 62305-1:2024 padroniza com mais rigor os testes de componentes:
A revisão aprofunda a abordagem dos ensaios com foco em:
Componente Alteração na Revisão A
Captação Mantém critérios, mas reforça o uso de carga Qlonga com pulso único.
Conexão Melhora a definição de testes térmicos e mecânicos com pulso ≤ 2 ms.
Centelhadores Detalha o di/dt isoladamente e reforça a exigência da carga Qcurta.
DPS Passa a remeter diretamente à NBR IEC 61643, não duplicando ensaios.
Impacto: Padronização dos testes com maior precisão e rastreabilidade. Reforça a confiabilidade dos dispositivos de SPDA.
2.2 Equações Técnicas e Parâmetros
A revisão reorganiza algumas equações e amplia materiais analisados:
Equação/Tabela | Alteração | Impacto Prático |
D.7 | Expansão da tabela de resistividade térmica (Ex: aço cobreado 30/40/53% IACS) | Apoia projetos com materiais modernos e alternativos |
D.9 | Melhora no detalhamento físico da equação anodo-catodo | Mais confiabilidade na previsão de dano térmico |
2.3 Terminologia e Alinhamento com IEC
A REVISÃO adota expressões como “estrutura perigosa ao meio ambiente” e “elemento-vítima“, reforçando a aderência à terminologia da IEC 62305-1.
- elemento-vítima – elementos passíveis de receber o centelhamento causado pela proximidade ao SPDA
2.4 Conclusão Técnica Parte 1:
A REVISÃO evolui em aspectos de testes, linguagem normativa e escolha de materiais, mas ainda não incorpora integralmente abordagens probabilísticas, EMC e digitalização, como já adotado pela IEC 62305-1:2024.
3 Parte 2 – Gerenciamento de Risco (NBR 5419-2)
3.1 Conceito e Modelo de Risco
Mantém a lógica estrutural da versão de 2015, mas com melhorias gráficas e clareza em fluxogramas decisórios.
Item | NBR 2015 | REVISÃO A | IEC 62305-2 |
Risco Tolerável | Tabelado sem justificativas | Mesmos valores com justificativa | Mesmos valores com base histórica e contexto técnico |
Componentes S1-S4 | Dispersos | Reorganizados com diagramas | Modular e interativo com simulação digital |
Destaque: A REVISÃO torna a norma mais acessível, mas a IEC já entrega automação e integração com redes inteligentes (IoT, TI, Smart Grids). Permite integração com softwares e sensores de campo (smart monitoring).
A IEC 62305:2024 introduz um modelo modular e interativo com simulação digital integrada e interface com redes inteligentes (smart grids). Isso significa que os sistemas de proteção contra descargas atmosféricas agora podem ser projetados, simulados, monitorados e ajustados em tempo real, com base em dados ambientais, registros de descargas, sensores remotos e plataformas SCADA. Essa abordagem permite resposta adaptativa, manutenção preditiva e integração com outros sistemas de gestão de energia, segurança e TI.
3.2 Avaliação Quantitativa e Perdas
Item | REVISÃO | IEC 62305-2 |
Probabilidades | Mesmas tabelas com melhor contextualização | Base em dados históricos e séries reais |
Perdas L1-L4 | Matriz de decisão por contexto | Adiciona perdas por disrupção digital (TI, IoT) |
Recomendação: Para projetos de alta criticidade, como indústria 4.0 e data centers, adotar as práticas da IEC 62305-2 mesmo antes da normatização nacional.
4 Parte 3 – Projeto do SPDA (NBR 5419-3)
4.1 Inspeções, Manutenção e Continuidade
A REVISÃO moderniza o capítulo mais negligenciado da versão anterior: inspeções e manutenção.
ITEM | NBR 5419-3:2015 (Vigente) | REVISÃO A (2025) | MUDANÇA |
Periodicidade Visual | Recomendada semestral | Obrigatória anualmente | ✔️ Formalização |
Inspeção Completa | Anual (especial) A cada 3 ou 5 anos (por Classe) | Mantida frequência, + inspeções extraordinárias obrigatórias | ✔️ Expansão |
Inspeção Pós-Evento | Não prevista claramente | Exigida após: reformas, descargas, danos estruturais etc. | ✔️ Inclusão |
Documentação | Recomendável, sem padronização | Obrigatória: relatório técnico com fotos, data, RT habilitado | ✔️ Rigor formal |
Instrumentação | Genérica: ohmímetro | Equipamentos calibrados exigidos. | ✔️ Rastreabilidade metrológica |
Ensaios de Continuidade | Definidos no Anexo F | Reestruturados com roteiro prático, critérios para novos e existentes | ✔️ Operacionalidade |
Armazenamento de Laudos | Não exigido | Recomendado ≥ 5 anos | ✔️ Conformidade jurídica |
Responsável Técnico | Recomendado | Obrigatório com ART / RRT | ✔️ Formalização legal |
A nova IEC:
- Torna obrigatório o uso de sensores e monitoramento remoto em SPDA;
- Exige digitalização das inspeções, com registro de foto, data, local e ART;
- Define periodicidade por criticidade e exposição, não apenas por classe de SPDA.
4.2 Continuidade e Documentação
- Anexo F da IEC detalha procedimentos de medição instrumentada com curva de continuidade;
- Introduz checklists digitais e QR codes nos pontos de inspeção.
Análise crítica: A REVISÃO finalmente fecha lacunas práticas e obriga relatórios formais. Entretanto, a IEC já exige automação e integração com softwares de gestão de ativos.
4.3 Distanciamento de Descidas
A REVISÃO mantém os critérios de distanciamento por classe, mas:
- Adiciona conceito de distância real percorrida;
- Introduz exceções para geometrias irregulares e estruturas elevadas;
- Melhora as figuras explicativas.
CRITÉRIO | NBR 2015 | REVISÃO A | MUDANÇA |
Distância Máxima por Classe | 10 m (I), 15 m (II), 20 m (III/IV) | Mantidos | ➖ |
Critérios Geométricos | Pouco claros | Figuras + fórmulas + orientação por perímetro | ✔️ Melhoria didática |
Adaptação a estruturas irregulares | Não prevista | Nova abordagem por “distância real percorrida” | ✔️ Técnica |
SPDA Isolado | Raramente citado | Critérios visuais e dimensionais incluídos | ✔️ Atualização |
4.4 Áreas Classificadas – Anexo D
ITEM | NBR 2015 | REVISÃO A | MUDANÇA |
Natureza do Anexo D | Informativo | Agora técnico-normativo | ✔️ Rigor |
Integração com IEC 60079 | Não vinculada | Obrigatória (Zonas 0, 1, 2 etc.) | ✔️ Essencial |
Componentes Certificados Ex | Não exigido | Obrigatórios: conectores, blindagens, suportes | ✔️ Alta criticidade |
Recomendações específicas | Genéricas | Separação física, proibição de SPDA ativo, uso de Franklin isolado | ✔️ Convergente com ATEX |
Ensaios e Laudo Técnico | Recomendado | Obrigatórios com RT + ART + inspeções periódicas | ✔️ Norma robusta |
4.5 Proteção a Céu Aberto
ITEM | NBR 2015 | REVISÃO A | MUDANÇA |
Áreas sem cobertura | Menções genéricas | Critérios objetivos por presença humana + altura de captores | ✔️ Prático |
Postos de trabalho expostos | Não abordado | Obrigação de proteção ou isolamento com gaiola metálica | ✔️ Humano-centrado |
Distanciamento entre captores | Não definido | Tabelado por altura, com figuras explicativas | ✔️ visual e técnico |
Avaliação de Risco em áreas externas | Não exigida | Obrigatória para tanques, silos, depósitos etc. | ✔️ Coerente com ISO/IEC |
4.6 Tabelas Técnicas
Novidades incluem:
- Tabela 4 – Elevações máximas de temperatura ∆T da superfície interna e tempo de duração t50 (s) para diferentes espessuras t’’ (mm) e componente longa da descarga de acordo com NP I (Q = 200 ºC)
- Tabela de continuidade com valores esperados por ponto;
- Checklists de inspeção periódica;
- Novas seções de materiais (35 mm² e 100 mm²);
- Identificação de ações corretivas em inspeções.
- Material, configuração e dimensões mínimas de eletrodo de aterramento não naturais, agora volta a usar 19 fios em cobre encordoado!
Não ocorreram alterações;
- Valores máximos dos raios da esfera rolante, tamanho dos módulos da malha e ângulo de proteção correspondentes ao nível de proteção do SPDA
- Espessura mínima de chapas metálicas ou tubulações metálicas em subsistemas de captação
- Tabela 5 – Distância entre os condutores de descida e entre anéis intermediários de um SPDA externo não isolado de acordo com o nível de proteção do SPDA
Resultado: A REVISÃO instrumentaliza o engenheiro de campo com tabelas práticas e checklist de verificação.

Observação importante: Figura A.1 – Volume de proteção provido por um captor vertical, exemplifica e melhora o entendimento sobre o volume de proteção de captores verticais em função da altura, percebe-se claramente para o dimensionamento.
Figura 1Figura A.1 – Volume de proteção provido por um captor vertical ABNT/CB-003
5 Parte 4 – Sistemas Internos de Proteção (NBR 5419-4)
Embora pouco destacada, esta parte alinha-se com a abordagem de equipotencialização e instalação de DPS. Esta seção é crucial para a proteção de eletrônicos sensíveis. A afirmação “Integra a proteção interna com EMC, redes TI e automação” na IEC 62305-4:2024 é um divisor de águas.
A REVISÃO elimina repetições com a NBR IEC 61643 e adota referência direta aos sistemas de proteção interna, unificando a abordagem com a Parte 1.
Impacto na Indústria 4.0: Sem a plena integração com EMC (Compatibilidade Eletromagnética) e sistemas de TI, a NBR 5419-4 revisada pode deixar edificações modernas (indústria 4.0, edifícios inteligentes, hospitais) vulneráveis a danos não físicos, mas funcionais e de dados, que podem ser financeiramente mais catastróficos.
A IEC 62305-4:2024 introduz com ênfase renovada o conceito de ZPR – Zonas de Proteção contra Raios, como elemento central no projeto de proteção interna. Diferente da NBR 5419-4:2015 (rev. A), que ainda trata de forma menos sistematizada essas zonas, a IEC posiciona as ZPR como camadas funcionais de contenção e mitigação de surtos dentro da arquitetura da instalação, permitindo segmentar eletricamente áreas sensíveis e integrar a proteção física com a lógica dos sistemas EMC, TI e automação. Essa abordagem é particularmente crítica para aplicações em ambientes da Indústria 4.0, hospitais e edifícios inteligentes, onde a perda de funcionalidade de dados pode ser mais danosa que a destruição física.
6 Conclusão Geral
Critério | REVISÃO A | IEC 62305 (Internacional) |
Alinhamento com tecnologias modernas | ⚠️ Parcial | ✅ Completo |
Digitalização, EMC, redes inteligentes | ⚠️ Incompleto | ✅ Totalmente integrada |
Inspeção e manutenção documentada | ✅ Reforçada | ✅ Automatizada e rastreável |
Abordagem probabilística | ❌ Ainda baseada em tabelas fixas | ✅ Realista e baseada em dados |
Aplicabilidade prática | ✅ Alta para engenheiros de campo | ✅ Com ferramentas avançadas |
6.1 Sistemas Internos (NBR 5419-4 / IEC 62305-4:2024)
- Adota definitivamente o conceito de ZPR (zonas de proteção contra raios);
- Integra a proteção interna com EMC, redes TI e automação;
- Define coordenação entre DPS por nível de proteção e tempo de resposta;
- Estabelece compatibilidade com normas IEC 61000 e IEC 61643 em tempo real.
Conclusão: A proteção interna é tratada como sistema inteligente, responsivo e integrado.
7 Dúvidas ainda não plenamente esclarecidas
Apesar das atualizações recentes da IEC 62305, algumas questões práticas permanecem com interpretações variáveis no mercado e merecem aprofundamento técnico:
- Ensaios em inspeções completas: A norma apresenta no Anexo F diretrizes para verificação da continuidade elétrica, mas não esclarece de forma taxativa quais medições são mandatórias em casos de eletrodos horizontais não naturais. Ainda é recorrente a dúvida: a continuidade elétrica medida por baixa resistência seria suficiente para validar a eficácia da malha de aterramento? Ou seria mais adequado priorizar medições por queda de potencial, além da avaliação de tensões de passo e toque, que abordam diretamente a segurança operacional?
- SPDA natural em estruturas metálicas: Em edificações com estrutura metálica, a ausência de condutores enterrados conectando colunas metálicas individuais ainda gera questionamentos. Se essas colunas são interligadas por uma viga metálica abaixo de 6 m de altura, tal interligação seria tecnicamente válida como equipotencialização natural? E mais: será que a fundação isolada de cada coluna — envolta em concreto com propriedades hidroscópicas — não oferece dissipação mais eficiente do que um anel de cobre de 50 mm² tradicionalmente prescrito?
- Sem o valor de referência de <10 Ohms, o projetista deveria fornecer o valor calculado da resistência da malha de aterramento previsto e assim comparar com o valor inicial medição pós-obra e depois nas medições de inspeções periódicas. Mas, isso não está acontecendo. De quem é a responsabilidade deste tema?
8 Recomendação Técnica Final
A REVISÃO da NBR 5419 representa um avanço técnico real e necessário. Contudo, ainda está defasada em relação à IEC 62305-2024.
Para projetos críticos, de alta responsabilidade e ambientes sensíveis, é altamente recomendável que os profissionais:
- Adotem desde já os critérios da IEC como referência técnica superior;
- Enviem contribuições técnicas formais na consulta pública, cobrando a inclusão de critérios modernos, tais como:
- Digitalização obrigatória;
- Integração com EMC e TI;
- Monitoramento remoto;
- Simulação computacional de desempenho do SPDA.
9 Sugestão de Tópicos para Envio na Consulta Pública:
- Tornar obrigatória a digitalização e rastreabilidade das inspeções.
- Adotar critérios de ensaio térmico e monitoramento remoto, como previsto na IEC.
- Inserir módulo dedicado à proteção de redes digitais, automação e TI crítica.
- Padronizar critérios de desempenho eletromagnético (EMC) para SPDA interno em alinhamento com IEC 61000 e 62305-4.
- Abordar com profundidade a integração com normas de Ex, como a ABNT NBR IEC 60079-0/-11/-14/-25.
“Este artigo representa nossa análise e opinião sobre as propostas de revisão das normas técnicas em consulta pública até a presente data. Estas considerações são passíveis de atualização e refinamento.”
Agradeço
Glauber Maurin
Diretor
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